quarta-feira

Passava no bar geralmente às sextas-feiras, de calça legging ou vestido curto, às vezes vinha de tamanquinho:

_ Olha, seu Onofre, fiz o pé agora, não ficou bonitinho? - e ergue o pé.

O seu Onofre tenta achar equilíbrio apoiando o copo no balcão, examina a beldade toda:

_ Ficou, meu anjo, ficou lindo.

E enxuga a testa, o pobre. Ela mora num prédio novo, com piscina e churrasqueira, na mesma rua do boteco. É casada, anda bem maquiada e perfumada, o marido tem carro novo.

É quando as mesas da calçada fervem no derradeiro furdúncio da semana que ela aparece, fazendo graça no meio da rapaziada, homens da gráfica, da oficina e das construções que pipocam pelo bairro. Bebe pouco, com uns e com outros, seu negócio é papear e chamar a atenção para os resultados da malhação ou da dieta no seu corpo, o novo corte do cabelo, o brinquinho que ganhou .

Sempre há um pra lhe meter uma palmada no traseiro. Ela se faz de bravinha, não tanto que atrapalhe a diversão, e estapeia de leve o braço do atrevido. Às vezes sai com o engenheiro que tem uma fabriqueta ali perto, sobe no carrão e zapt.

Umas duas vezes o engenheiro levou a esposa pra comer a feijoada de sábado no boteco. O povo em volta ficou tenso; e se a outra...? Mas ela só vinha às sextas.
Comecei com uma conversa sobre Proust, emendei com uma história de fetiche costurada com gíria e nomes sujos. É um jeito fácil de parecer interessante, fazer uma mistura entre o clássico e o underground tentando desnortear o alvo e criar a ilusão de múltiplas possibilidades.

Na beira da praia fiquei nua na sua frente já que nem mesmo todos os meus esforços e shorts cavados daquele verão foram suficientes para convencê-lo de que não, eu não era a garota proibida do papai, mil machados não pesavam sobre a minha cabeça e de quem mais se aproximasse. Tentei parecer segura e livre e despida mergulhei na água morna da noite, esperando que o apelo do meu corpo o fizesse decidir.

Até o fim foi assim, mesmo nos outros dias todos em que me chupava os dedos e não havia lençóis que bastassem para os nossos fluidos, mesmo quando tudo aquilo que hoje preferimos calar turvava o nosso olhar, sempre houve nele algo que fugia, como se no bolso trouxesse um canivete alerta, a apreensão resumida num guarda-chuva de reserva.
Um tapa, na cara.
_ Gosta do meu rosto na tua mão?
Outro.
_ Gosto. Gosto de ver tua cara também.
_ Cara de quê?
_ De susto e de quero mais.
Outro. Outro, outros.